07/06/2019 - O Triste Fim De Cielo Na Bolsa
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Por: Bruce Barbosa
Faca caindo
Muito mais importante do que saber o que fazer é saber o que NÃO fazer.
E Cielo (CIEL3) é um caso claro de armadilha para os incautos.
Nós mesmos, na série O Investidor de Valor, já perdemos dinheiro com a empresa nos idos de 2017.
Entramos em dezembro de 2015 e saímos em junho de 2016. Ganhamos +21 por cento.
Entramos em outubro de 2016 e saímos em janeiro de 2017. Perdemos -23 por cento.
Demoramos para entender o que se passava.
A rainha da bateria
Cielo é controlada por Banco do Brasil (BBAS3) e Bradesco (BBDC4).
E sempre foi queridinha pelo mercado.
A companhia fez seu IPO (estréia no mercado) em junho de 2009 e, simplesmente, voou.
Enquanto Cielo gerava uma tonelada de caixa e tinha lucros crescentes, suas ações reinavam no mercado.
Em meados de 2015, Cielo subia mais de +370 por cento desde seu IPO e BBAS e BBDC apenas +100 por cento.
Então, o que aconteceu com a Cielo?
O que mudou para causar a derrocada desde o fim de 2017?
Protegida por pai e mãe
Cielo afirmava que o alcance de seus dois controladores (BB e Bradesco) consistia em uma enorme barreira de entrada.
O relacionamento e o alcance de seus controladores criava uma barreira intransponível para novos entrantes no setor de adquirência.
O relacionamento com o lojista seria o mais importante.
E só Cielo teria acesso a todo o território nacional.
E Cielo possuía algo ao redor de 53 por cento de participação de mercado.
Fazia todo o sentido.
Comendo pelas beiradas
Eu mesmo produzi um relatório descrevendo como as barreiras de entrada de Cielo eram enormes.
E todas elas baseadas na escala.
Cielo era a maior, tinha a melhor tecnologia e controladores presentes em todo o território nacional.
Quem seria capaz de vencê-la?
Mas os grandes bancos já lhe comiam pelas beiradas.
Rede, do Itaú (ITUB4) sempre foi relevante, mas Santander (SANB11) e Banrisul (BRSR6) cresciam suas participações rapidamente.
Os bancos estavam apenas ocupando o espaço que lhes cabia.
O mercado de adquirência refletiria as participações do mercado bancário.
Fazia todo o sentido.
A enxurrada de competidores
O Banco Central trabalhou para aumentar a competição do setor, retirando barreiras criadas pelos bancos.
Mas o mercado só entendeu MESMO o perigo que Cielo corria quando PagSeguro partiu para uma oferta de ações (IPO) nos EUA.
As ações estrearam em janeiro de 2018 e foi um sucesso tremendo: +36 por cento de no primeiro dia de negociação.
Stone veio em seguida, e subiu +31 por cento no 1o dia.
Foi o início da enxurrada de competidores entrando no mercado.
Toda quitanda de esquina anunciou que teria sua própria marca de meios de pagamento.
A "guerra das maquininhas" se tornava oficial.
Guerra de preços
Em 2018, vimos o poder dos novos entrantes.
Em 2018, vimos os resultados de Cielo caírem de um penhasco.
Em outubro de 2018, a companhia trocou seu CEO que anunciou guerra de preços.
Finalmente a companhia percebia que o lojista só se importava com uma coisa: preço.
Simples. A maquininha mais barata ganharia a guerra.
Cielo faria o que fosse possível para segurar a queda de seu market share.
Mas Cielo ainda alimentava o sonho infantil de que voltaria a crescer em 2020.
Um choque de realidade
No final de maio último, Cielo abandona seu guidance e anuncia corte de dividendos.
Pagaria apenas 30 por cento dos lucros, em vez dos 70 por cento usuais.
Faz todo o sentido.
Cielo entendeu que nunca mais seria lucrativa como outrora.
E o Itaú, entendendo o cenário, decidiu asfixiar a enxurrada de competidoras.
Anunciou que pagaria os lojistas em 2 dias, retirando o oxigênio das pequenas (o capital de giro).
O Itaú, categoricamente, nos certificou: adquirência não gera mais valor.
Itaú fechou o capital (retirou da bolsa) da Rede em 2012.
Cielo pode seguir o mesmo caminho.
Acabou o sonho.
É o fim de uma era.
É o fim de Cielo na bolsa.
Quanto vale a Cielo?
Cielo parece barata hoje a 7x Ebitda e 6x lucros.
Mas aqui, o passado importa pouco.
Tudo mudou.
O setor de adquirência não possui barreiras de entrada.
Em teoria, sem barreiras, a rentabilidade do negócio converge ao custo de capital.
O ROE (rentabilidade sobre patrimônio) de CIEL deveria cair para algo ao redor de 10 por cento (atualmente gira em torno de 30 por cento).
Os lucros deveriam encolher mais -70 por cento.
Ao fim e ao cabo, faz mais sentido que Cielo se torne um serviço agregado de seus controladores.
Em algum momento, BB e Bradesco deverão fechar o capital (tirar da bolsa) da companhia.
Cielo não faz mais sentido separada de seus pais.
Cielo não agrega mais valor como empresa independente.
É o fim de Cielo na bolsa.
RIP.
Cielo está morta. Vida longa à Cielo
Cielo namora com a ideia de criar um banco digital.
Após adquirência, bitcoin e fintech; banco digital é a resposta para todas as perguntas existentes (e não existentes).
Mas os controladores de Cielo já possuem bancos digitais dentro de suas estruturas.
Seriam os velhos bancos os próximos a serem varridos pela competição?
Sim e não.
Mas esta é uma conversa para depois que nos recuperarmos do luto.