29/10/2018 - Stone eleva oferta e ação sobe 31% na estreia
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VALOR
Por: Maria Luíza Filgueiras e Talita Moreira
Com o discurso e a estratégia de estar o mais próximo possível dos clientes e colocá-los em primeiro lugar, a empresa brasileira de meios de pagamento Stone resolveu fazer isso também em sua estreia na bolsa americana Nasdaq ontem. Quem tocou o sino que marca o início de negociação no pregão foi Geraldo "Mineiro", o primeiro cliente da empresa, ao lado de André Street, cofundador da Stone, e Thiago Piau, presidente da companhia.
Vendedor de queijos, Mineiro e a esposa fizeram sua primeira viagem internacional para participar da cerimônia em Nova York, junto a um grupo de cerca de 50 pessoas - conforme uma fonte, eram sócios e funcionários da Stone, de todos os níveis hierárquicos da empresa, e "todos pagando do próprio bolso".
Na estreia, a ação disparou mais de 30% logo nos primeiros 10 minutos de negociação e fechou o dia com valorização de 30,63%, cotada a US$ 31,35. O valor de mercado ontem chegou a US$ 8,7 bilhões. A concorrente de maquininhas de pagamento PagSeguro, listada na Nyse, vale US$ 9,6 bilhões.
De acordo com duas pessoas que participaram da oferta, a demanda para reservas no "livro" da oferta chegou a US$ 20 bilhões - a empresa buscava, inicialmente, US$ 1,1 bilhão. "Foram quase 500 investidores institucionais. É muita coisa e ainda é impensável para uma oferta em bolsa no Brasil", diz um executivo.
O elevado interesse por ações na oferta da Stone fez com que a companhia alterasse não só o preço como também o volume de ações vendida. A decisão de preço foi rápida: o valor por ação foi redefinido a US$ 24, como antecipado pelo Valor. A faixa indicativa de preço no prospecto preliminar era de US$ 21 a US$ 23.
Mas o debate sobre como e quanto acomodar da demanda dos investidores foi mais longo. Somente às 22h de quarta-feira, dia da precificação, a companhia e os bancos coordenadores concluíram a discussão sobre o tamanho da oferta. O caminho definido foi elevar a parte secundária em 3,4 milhões de ações - passando o total das ofertas primária e secundária de 47,7 milhões para 51 milhões de ações. Com o adicional de 9,1 milhões de subscrição que os bancos coordenadores podem subscrever, chega a cerca de 60 milhões de ações totais na oferta.
Assim, o volume levantado no IPO foi de US$ 1,4 bilhão. Soma-se os US$ 100 milhões de aporte direto feito pela chinesa Ant Financial, chegando à captação de US$ 1,5 bilhão. A empresa vai usar os recursos para expansão, aquisições, novas tecnologias e produtos.
O desempenho negativo do mercado americano nos dias que antecederam a listagem e um ataque de hackers a um software da empresa, com chantagem à administração, também na véspera da estreia, chegaram a levantar alguns questionamentos de poucos investidores - mas, ao fim, não afetaram a oferta. "Claro que não é bom ter esse tipo de acontecimento na reta final de uma operação que vinha super redonda, mas não houve mudança para a oferta", diz um executivo. "O humor para Brasil melhorou muito, a taxa de câmbio já tem mostrado isso", complementa.
Os estrangeiros já tinham demonstrado forte apetite por empresas brasileiras de meios de pagamento nas duas ofertas feitas pela PagSeguro este ano. De acordo com envolvidos nessas operações, os investidores estrangeiros veem oportunidades em empresas que apresentam crescimento acelerado mesmo no período de economia brasileira fraca, em um setor em transformação como o de meios de pagamento, e em que a participação de mercado das companhias ainda é reduzido - o que seria um indicativo de espaço para expansão.
No caso da Stone, conforme duas fontes, contribuiu na atração de investidores o fato de que a companhia já tinha feito rodadas de captação privada - a gestora americana T. Rowe Price, que gere mais de US$ 1 trilhão, e a Madrone Capital Partner, que gera a fortuna da família Walton, herdeiros do Walmart, assim como as gestoras de private equity Actis e Gávea, e ainda pessoas físicas, como os fundadores brasileiros da 3G Capital, que já eram acionistas da Stone.
"Outros investidores relevantes já tinham sido contatados pela empresa anteriormente, mas só investem em empresas listadas, por isso esperaram o IPO", explica um executivo. "Os sócios fizeram um trabalho anterior se aproximando de investidores e apresentando a empresa. A Stone não era uma história desconhecida do investidor internacional."
Além disso, a reserva de ações pela Berkshire Hathaway, de Warren Buffett, aumentou os holofotes sobre a operação. Uma semana depois, a gigante chinesa Ant Financial, subsidiária de meios de pagamento do grupo Alibaba, fechou um aporte privado da empresa de US$ 100 milhões, ao preço por ação do IPO.
A Ant preferiu um "private placement", no jargão do mercado, para estar mais próxima à Stone e à administração, diz uma fonte. "A Ant tem uma visão estratégica desse investimento, e não uma avaliação de investimento financeiro", afirma essa fonte. "A companhia vem buscando crescimento em mercados estratégicos, e o Brasil é um deles. Essa forma de investimento, mesmo que pequena no volume total, é um jeito de colocar o pé dentro da empresa", explica.