19/01/2018 - A nova arte de fazer dinheiro
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O mercador veneziano Marco Polo usou a palavra alquimia para descrever o processo de transformação de cascas de amoreira em dinheiro de papel sem nenhum tipo de lastro, que testemunhou no fim do século XIII, numa China comandada pelo neto de Genghis Khan.
A mesma estupefação diante da "arte de fazer dinheiro" a partir do nada acomete agora a sociedade contemporânea, que viu algumas linhas de código de programação de computador se transformarem em bitcoins e outras criptomoedas com valor em circulação que superou US$ 750 bilhões em questão de meses - cifra que caiu para menos de US$ 450 bilhões após forte queda nos últimos dias, diante da ameaça de aumento da regulação.
Com a diferença de que, hoje, a adesão de dezenas de milhões de usuários às moedas digitais é voluntária, sem que seja necessário ameaçar alguém de morte para garantir sua aceitação.
A espetacular popularização do bitcoin em 2017, contudo, não é suficiente para que especialistas em sistema financeiro prevejam a substituição do dinheiro pelas criptomoedas, nem para que se dediquem a antever potenciais consequências que o uso amplo de dinheiro privado poderia ter em termos de política monetária.
O dinheiro tal como o conhecemos está, sim, com os dias - ou talvez os anos - contados, sentencia a maioria desses especialistas. Eles veem como provável a criação de moedas digitais por países no médio prazo, como vem estudando pioneiramente o banco central da Suécia. Mas consideram o futuro do bitcoin ainda incerto.
Além de aspectos culturais e tecnológicos, as projeções envolvendo o futuro dos meios de pagamento devem considerar que há ao menos outros três fatores relevantes nesse jogo: o crime, o poder dos Estados nacionais e o que a gestão do dinheiro rende hoje aos bancos.
Estudo de 2017 da Boston Consulting Group (BCG) estima que as instituições financeiras e as empresas do segmento de cartões tiveram receita de US$ 1,2 trilhão com o sistema de pagamentos global em 2016. A cifra, que representa entre 20% e 25% do total gerado pela atividade bancária, inclui taxas cobradas em transferências internacionais, em pagamentos de compras com cartões de crédito e débito, tarifas de manutenção de contas e sobre transferências locais, além do ganho com juros sobre o depósito não remunerado de clientes em contas correntes.
Nada indica que bancos assistirão passivamente a esse segmento ser atacado por entrantes sem reagir, contando ainda com a ajuda de reguladores conservadores que apreciam estabilidade e segurança para o sistema. Tampouco dá para dizer que a digitalização do dinheiro seja algo totalmente novo para os agentes desse mercado, que já viram a invenção das transferências eletrônicas e dos cartões de crédito e débito, embora ninguém subestime o bitcoin e a tecnologia que o tornou possível.
"Antes da febre das criptomoedas, ainda no início dos anos 1990, já estava estabelecido que a moeda tinha se tornado, além de abstração, impulso magnético. A fronteira entre o que é moeda propriamente e o que é um ativo já ficou mais fluida do que nunca. Foi a época em que os bancos centrais começaram a adotar os sistemas de meta de inflação e abandonaram o controle dos agregados monetários, M1, M2, que tinham perdido o sentido", diz o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco e sócio-fundador da Rio Bravo Investimentos.
A sacada do criador do bitcoin, Satoshi Nakamoto (um pseudônimo, não se sabe se é uma ou mais pessoas), foi impedir que um participante do mercado gastasse o mesmo dinheiro duas vezes, já que, na internet, quando envia foto ou arquivo a um destinatário, o remetente sempre guarda uma cópia do anexo transmitido.
Para evitar esse gasto duplo, em vez de usar intermediário único como um banco ou empresa de cartão, Satoshi teve a ideia de validar as transações por meio de tecnologia de supervisão pública e descentralizada, conhecida por blockchain ou, mais precisamente, por tecnologia de registro descentralizado, do inglês "distributed ledger technology", ou DLT.
O termo blockchain é usado porque as transações ficam registradas em blocos de informação, com tamanho fixo e ordem cronológica, formando cadeia. Como o histórico de transferências é de conhecimento amplo - embora os nomes de remetentes e destinatários sejam protegidos atrás de uma "chave" de criptografia -, os participantes validam de forma consensual a criação dos novos lotes de transações, o que, no caso do bitcoin, ocorre a cada 10 minutos.
Para inibir que a cadeia de blocos seja substituída, por hackers mal intencionados, por uma falsa, o sistema exige prova de esforço para que cada novo bloco seja formado. Essa prova se dá por meio da solução de um desafio matemático que envolve a descoberta de uma senha de dezenas de dígitos gerada aleatoriamente, tarefa que exige hoje capacidade computacional gigantesca e consumo de energia altíssimo - no fim do ano, era equivalente ao consumo da Irlanda. Não há sinais de que parará de subir.
Os que se dedicam ao trabalho de descobrir as senhas dos novos blocos são chamados de mineradores. O prêmio para o grupo que resolve o problema matemático é hoje de 12,5 bitcoins por bloco - algo como US$ 125 mil a cada dez minutos pela cotação de quarta-feira -, além das taxas pagas nas transações realizadas. Os mineradores repartem os lucros entre todos do grupo (pools) que ofereceram capacidade computacional para resolver o problema.
Por meio desse sistema, o blockchain ataca a questão de fundo que todo sistema de pagamentos procura solucionar: quem vende quer ter certeza de que vai receber o dinheiro e quem compra quer receber a mercadoria ou serviço.
Teoricamente, a tecnologia é capaz de subverter a forma como as pessoas fazem pagamentos de compras, remessas internacionais, adquirem ações ou títulos de dívida e executam contratos - que até então dependiam de intermediário ou de contraparte central para funcionar. "Essa é uma área muito promissora da DLT, porque ela oferece segurança", diz o ex-presidente do Banco Central e sócio da Gávea Arminio Fraga.
Reconhecer a relevância da nova tecnologia, contudo, não implica considerar que o blockchain será superior a todos os sistemas de pagamento e liquidação que existem hoje.
Uma possível aplicação do blockchain seria substituir câmaras de compensação, como a da área de pós-negociação nas bolsas. "Ela torna a atividade de clearing possível sem autoridade centralizadora. Mas para que mesmo você precisa não ter essa autoridade centralizadora?", questiona Franco, para quem a DLT, no caso, é uma solução a espera de um problema
Com perspectiva menos cética, ele e outros especialistas veem o uso das criptomoedas para baratear o custo de transferências internacionais, área em que a tecnologia parece se mostrar mais útil até agora. "Essas experiências de transferência internacional de dinheiro têm sido espetaculares. E embora haja empresas para concorrer com a Western Union no mercado de remessas, há custos mirabolantes. É ótimo que uma nova tecnologia permita que você possa fazer por custo mais barato", diz Franco.
Também ex-presidente do Banco Central, sócio da Tendências e conselheiro de administração do Itaú Unibanco, Gustavo Loyola diz que os intermediários financeiros tradicionais "estão sendo desafiados dia a dia por inovações" no segmento de meios de pagamento e buscam responder às novidades. Na área de transferências internacionais, além de estudos realizados em redes privadas de blockchain (a supervisão é feita por um grupo de bancos, mas não abertamente na internet), instituições internacionais como a American Express e o Santander no Reino Unido usam, em fase de testes, sistema da empresa Ripple com a tecnologia de blockchain, para transferir dinheiro internacionalmente -, mas sem usar a criptomoeda de mesmo nome desenvolvida pelo mesmo fornecedor.
Apesar de citada como a empresa a sofrer as consequências das transferências internacionais viabilizadas pelas critptomoedas, a Western Union se mostra confiante no seu modelo de negócios, por meio do qual processou 31 transações por segundo em 2017 e movimentou US$ 150 bilhões. "Acreditamos que a moeda tradicional como a conhecemos não vá embora. Dinheiro em espécie é a forma predominante de pagamentos em muitos lugares do mundo, é difícil de ver isso mudar em breve", disse em nota Felipe Buckup, presidente da Western Union no Brasil, que diz que a taxa média de suas transações fica entre 3% e 4% do principal.
Mas embora o uso das moedas digitais na área de remessas seja visto como provável e viável, há muita dúvida a respeito da adoção do bitcoin (na sua versão atual) como a moeda de uso universal que seus criadores idealizaram.
Primeiro, um pouco de perspectiva quantitativa. Os US$ 160 bilhões de valor em circulação põem o bitcoin entre as 30 maiores moedas do mundo, o que é um grande feito. Porém, como a pretensão original da moeda é de uso global, e não local, a cifra parece reduzida quando se olha para os US$ 30 trilhões da base monetária mundial no fim de 2016 - no conceito que considera papel-moeda emitido e depósitos em conta bancárias -, conforme dados compilados pela agência de inteligência CIA no World Factbook.
No critério ampliado de base monetária, que inclui investimentos de curtíssimo prazo em operações compromissadas e assemelhadas, estamos falando de mais ainda mais dinheiro, ou cerca de US$ 79 trilhões em 2016. O bitcoin representa 0,2% desse total.
Guto Schiavon, sócio da Foxbit, uma das maiores corretoras de bitcoin do Brasil, confirma a percepção de que as pessoas que compram esse ativo o fazem mais com intuito de especular com espécie de ouro da era digital, do que para usar como meio de pagamento. O que mudou, diz ele, é que nos últimos seis meses os compradores são pessoas mais velhas, com mais dinheiro, e mais acostumadas com o sistema financeiro, em comparação com um público de jovens geeks que predominava antes neste mercado.
Segundo dados do site bitValor, que compila os negócios das corretoras no Brasil, investidores locais negociaram R$ 8,3 bilhões em bitcoins em 2017, sendo quase metade disso apenas em dezembro, quando o preço do bitcoin atingiu o recorde de US$ 19,5 mil no mercado externo.
No mundo, as negociações de criptomedas em corretoras movimentam cifras acima de US$ 35 bilhões por dia nos últimos 30 dias, o que mostra o apelo especulativo da classe de ativos.
Por outro lado, dados do site Blockchain, que reúne estatísticas sobre bitcoin em nível global, mostram que os pagamentos que transitam pela rede do bitcoin são relativamente pequenos: somaram US$ 366 bilhões nos últimos 12 meses, numa média diária de US$ 1 bilhão no mundo.
Embora o valor absoluto possa impressionar, ele representa apenas 0,09% dos US$ 420 trilhões em pagamentos que a BCG estima que tenham circulado pelo mundo em 2016, ou o equivalente a 5,5 vezes o PIB global daquele ano.
Problemas tecnológicos da própria rede do bitcoin, que fazem uma transação ter custo de cerca de US$ 15 para ser processada no primeiro novo bloco, ou seja, em até 10 minutos, são um empecilho para a moeda ser usada no varejo. Afinal, ninguém vai pagar uma taxa dessas para comprar um café que custe R$ 5,00, por exemplo. Além disso, a rede atual é capaz de processar de 3 a 7 transações por segundo, conforme estudo do Credit Suisse. Em comparação, o banco diz que empresas de cartões como a Visa costumam processar 1,5 mil transações por segundo.
Mas a velocidade da rede não é o único empecilho para o bitcoin. Para especialistas, a falta de aceitação no mercado e a alta instabilidade de preço funcionam como uma espécie de efeito Tostines para explicar a dificuldade de o ativo virtual vingar como moeda.
"Como unidade de conta o bitcoin é imprestável, diante da volatilidade. Pelo mesmo motivo, é menos confiável como reserva de valor", diz Loyola, citando duas de três características que a literatura aponta como definidoras de moeda, junto com a função de meio de pagamento. "Ninguém quer passar pela situação de achar que tinha US$ 5 milhões guardados e descobrir que no dia seguinte só tem US$ 1 milhão."
Para o sócio da Tendências, o bitcoin pode acabar tendo algum papel monetário, mas não a função total. "Tem gente que usa imóveis ou ouro como reserva de valor, sacas de soja como unidade de conta. Pode ser que bitcoin possa abarcar alguma dessas funções, como ocorre com outros ativos financeiros e reais. Mas sou cético em relação às criptomoedas tomarem o espaço das emitidas pelos Estados."
O especialista também vê como um problema a limitação antecipada da oferta de bitcoins em 21 milhões de unidades - hoje há cerca de 16,8 milhões emitidas -, supostamente para controlar efeitos inflacionários. "Para que foram criados os BCs? Para regular a oferta de moeda. Uma crítica ao padrão ouro é que não tinha flexibilidade para regular oferta de moeda para cima ou para baixo. A ideia é deixar isso na mão de um algoritmo? Como uma economia que cresce lida com oferta fixa de moeda?"
Para Loyola, embora a emissão de dinheiro privado não seja uma novidade histórica, é muito difícil os bancos centrais perderem o controle sobre a moeda. "Eu duvido. Exceto se os Estados perderem totalmente a credibilidade."
Já a criação de uma moeda digital por bancos centrais, possivelmente com a tecnologia do blockchain, é vista não só como possível, como provável pelos especialistas, que veem a comodidade que traria como imbatível ante a concorrência. "É melhor você usar uma moeda que pertença a um sistema de pagamentos eficiente, que seja aceita, que seja relativamente estável, que possa até pagar um jurinho. Em vez de ficar tocando sua vida em cima de ativo difícil de se analisar e de alta volatilidade", diz Arminio.
Mas embora uma inovação como essa permita, teoricamente, a abertura de conta diretamente no Banco Central, não está claro se os reguladores vão querer isso. "Seria como se houvesse 100% de compulsório, com zero alavancagem. É uma ideia antiga, aventada por Irving Fisher no início do século passado. Uma moeda digital assim diminuiria o escopo da atividade bancária. Mas não sei se isso é bom", diz Franco, questionando quem assumiria o papel de ofertar crédito exercido pelo banco comercial.
Mas se o bitcoin tem tantos problemas para ser usado na prática, porque ainda assim atrai tanta atenção e tanta demanda? Além de especuladores que apostam que a moeda repetirá a alta espetacular de 1.500% registrada em 2017 - e a queda de 40% no último mês mostra que ela não varia apenas para cima -, os especialistas veem outro atrativo no bitcoin. "Se não existem mais formas de transacionar quantias relevantes no sistema financeiro de forma anônima, novas tecnologias surgem para satisfazer a demanda por anonimato", diz o sócio da Rio Bravo.
Sem falar no uso para atividades tipicamente criminosas, como tráfico de armas e drogas, Franco diz que há motivações tributárias grandes para algumas pessoas quererem esconder dinheiro não declarado.
Contraintuitivamente, é por causa do aparente apelo do anonimato que as criptomoedas não terão futuro de longo prazo como meio de pagamento, mesmo que problemas tecnológicos e de flutuação de preço sejam resolvidos, diz Kenneth Rogoff, professor de Harvard e especialista na área. "Não sei de que forma se dará a regulação. Mas uma coisa que eu posso assegurar: os governos não vão tolerar formas de pagamento anônimas em grande escala, porque isso pode ser usado para evasão fiscal, corrupção, lavagem de dinheiro e para financiar o terrorismo. Os governos não vão aceitar isso", disse Rogoff em entrevista por telefone ao Valor.
Segundo ele, os governos deixam o mercado solto, permitindo a inovação ocorrer, porque as transações efetivas com criptomoedas têm peso irrisório na circulação de dinheiro - funcionando basicamente como um ativo especulativo.
Mas para Rogoff, assim que o uso como meio de pagamento se materializar, os governos devem agir. A regulação não pode impedir dois traficantes de droga de trocar criptomoedas entre eles, explica o professor. Mas ela pode tonar muito difícil usar moedas anônimas para transações legais no sistema bancário tradicional.
Para ele, é "muito ingênuo" achar que os países vão abrir mão do poder de controlar a oferta de dinheiro numa crise econômica ou numa guerra, por exemplo. "É difícil achar que você vai ganhar um jogo do governo quando ele pode mudar as regras continuamente até ele ganhar. No longo prazo, se você não pode usar a moeda para nada, ela terá um valor muito baixo."
Em recente entrevista, o secretário do Tesouro dos EUA, Steven Mnuchin, disse que vai trabalhar com o G 20 para evitar que as criptomoedas sejam as novas "contas numeradas da Suíça". Segundo ele, nos EUA, qualquer empresa que forneça carteira eletrônica de bitcoins e as corretoras de moedas digitais estão sujeitas às mesmas leis contra lavagem de dinheiro e precisam aplicar as políticas de "know your client" dos bancos. Mas em outros países não funciona assim e o Tesouro americano conta com a cooperação internacional para fechar essa brecha.
No Brasil, onde não há regulamentação, as principais corretoras da área afirmam que fazem esse controle voluntariamente, embora não haja supervisão para assegurar a prática.
Rogoff, que critica há anos a circulação de notas de alto valor, reconhece que dinheiro em espécie viabiliza transações criminosas de forma anônima. Mas afirma que as criptomoedas mudam totalmente a escala do problema. "Com elas você pode transferir, digamos, US$ 2 bilhões de forma anônima apenas apertando um botão, sem ninguém saber. O dinheiro pelo menos você precisa esconder, guardar, carregar."
Isso não tira o ímpeto do professor, porém, de reduzir a quantidade de papel moeda em circulação. No livro "A Maldição do Dinheiro", o pesquisador constata uma contradição que só pode ser explicada pelo uso ilegal do dinheiro. Segundo dados de pesquisa de hábitos consumidor feita pelo banco central americano, o uso de dinheiro físico caiu de 40% para 32% do total de transações de pagamento entre 2012 e 2015, enquanto o peso no volume financeiro diminuiu de 14% para 9% no mesmo período. Ao mesmo tempo, a quantidade de dinheiro em circulação como proporção do PIB não interrompeu a trajetória de alta observada desde a década de 1980, quando era de 4%, e vem se aproximando de um índice de 7,5% - sendo que mais de 80% do valor está em notas US$ 100.
Em termos per capita, seria como se cada americano tivesse mais US$ 4 mil em casa em notas de US$ 100, ou US$ 16 mil numa família de quatro pessoas - um cenário completamente irreal, mesmo após estimativas de que metade do dinheiro estaria fora dos EUA.
O aumento do dinheiro em circulação também ocorre em outros países desenvolvidos, apesar de cada vez menos usado no varejo, com o franco suíço se destacando na estatística de dinheiro disponível/população do país, com existência do equivalente a US$ 8,7 mil em circulação por cabeça.
Questionado sobre a falta de aparente mobilização dos governos em reduzir as notas de alta denominação, Rogoff diz que essa é apenas uma das duas batalhas nessa área. A outra é a não introdução de bilhetes ainda mais altos. "Os argumentos que sustento há 20 anos tiveram influência em evitar que uma nota de US$ 200 começasse a circular, como chegou a ser discutido, diante da perda que a inflação impôs sobre o valor da nota de US$ 100."
Ele menciona que a zona do euro parou de emitir a nota de €500 e que a Austrália segue esse caminho. "Não é algo que os países estejam correndo para fazer, embora devessem. Mas, em dez anos, muitos países farão. Porque haverá tão pouca gente usando notas altas que será difícil justificar a manutenção de sua circulação."
No Brasil, país de inflação e juros ainda altos, o dinheiro em circulação como proporção do PIB não se destaca no ranking internacional. Fica por volta de 3,5%, embora seja notável que as pouco usadas notas de R$ 100 respondam por 43% do valor. Até por isso, mesmo uma população calejada no assunto corrupção se surpreendeu com as malas com R$ 51 milhões em dinheiro do ex-ministro Geddel Vieira Lima - quantia que levou 14 horas para ser contada com auxílio de sete máquinas.
Numa tentativa de inibir episódios semelhantes, Banco Central e Receita Federal baixaram dois normativos no ano passado. O primeiro reduziu de R$ 100 mil para R$ 50 mil o valor máximo a ser sacado num banco, sendo que agora são necessários três dias de antecedência, e não mais um. Já o Fisco criou uma declaração eletrônica que deve ser preenchida por qualquer pessoa ou empresa que receba pagamentos acima de R$ 30 mil em espécie.
Rogoff diz que não tem pretensão de acabar com o crime ao defender o fim da circulação das notas de alto valor. "Você não vai mudar natureza humana o mudando sistema de pagamentos. Mas se houver uma redução de 5% a 10% na atividade criminosa já seria uma boa política”.