28/07/2015 - Pagamento via celular derruba fronteiras na África
VoltarPor Alexandra Wexler | The Wall Street Journal, de Johannesburgo | Valor Econômico
As maiores empresas de telecomunicações da África estão fechando parcerias que permitirão que seus clientes façam pagamentos entre operadoras de telefonia diferentes e cruzando as fronteiras de vários países, no mais recente passo da ascensão do continente no segmento da tecnologia financeira móvel.
A partir deste mês, a britânica Vodafone Group PLC e a sul-africana MTN Group Ltd. planejam permitir que os clientes do leste e do centro da África transfiram dinheiro entre eles. É a primeira vez que grandes empresas de telecomunicações do continente cooperaram na competitiva arena dos pagamentos móveis.
A nova parceria pode impulsionar ainda mais o crescimento econômico nesses mercados de rápida expansão e elevar a receita das operadoras de telefonia celular em países onde a demanda por novos dispositivos e o tempo de transmissão de dados já amadureceram. A competição acirrada é uma das razões pelas quais a MTN perdeu receita por usuário em 19 de seus 22 mercados no primeiro trimestre, informou a companhia.
"Finalmente, [as operadoras de telecomunicação] acordaram", diz Hans Kuipers, sócio da Boston Consulting Group baseado em Joanesburgo. "Para de fato desenvolver um ecossistema saudável, você tem que desenvolver interconectividade."
Essas empresas também esperam que a parceria possibilite que elas conquistem uma fatia maior do enorme mercado africano de transferências de dinheiro. O Banco Mundial estima que os africanos enviaram e receberam US$ 48 bilhões através de remessas no ano passado.
Até o momento, as empresas de celulares vinham resistindo a parcerias de "interoperabilidade" na corrida por uma maior participação de mercado. O serviço financeiro móvel de maior sucesso é o sistema M-Pesa, lançado em 2007 pela Safaricom Ltd., subsidiária da Vodafone no Quênia. Atualmente, os 14 milhões de clientes do M-Pesa podem pagar tudo por meio da plataforma, da hospedagem em acampamentos de safáris a corridas de táxi.
Agora, parte desse dinheiro pode ir para a MTN, através da nova parceria que permitirá pagamentos entre os clientes da Vodafone no Quênia, na República Democrática do Congo e na Tanzânia e os usuários da MTN em Uganda, Ruanda, Sudão do Sul e Zâmbia.
Uma dificuldade foi obter a aprovação do banco central em cada um dos mercados para enviar e receber dinheiro do exterior, segundo Serigne Dioum, diretor de serviços financeiros móveis da MTN. Até maio, a MTN tinha recebido autorização para receber dinheiro em Uganda assim como para enviar e receber dinheiro em Ruanda. A Vodafone não quis comentar.
Dioum diz que a MTN e a Vodafone buscaram combinar países onde a operadora tem forte presença com países onde as subsidiárias da Vodafone dominam o mercado, criando um alcance regional mais amplo para as duas empresas. A África Oriental, de acordo com o executivo, "é onde nossos serviços de dinheiro via celular têm mais penetração e onde eles estão indo bem".
A MTN e a Vodafone não informaram como elas planejam compartilhar os lucros dos pagamentos entre países feitos por meio de suas redes.
Dioum diz que a parceira vai reduzir as tarifas para transferência entre países de até 20% do valor da transação para 3% ou menos, algo que a MTN conseguiu em uma parceria piloto lançada no ano passado com a Airtel Burkina Faso para transferências entre Burkina Faso e a vizinha Costa do Marfim.
O Banco Mundial informa que reduzir essas tarifas em apenas cinco pontos percentuais resultaria em uma economia para os africanos de US$ 16 bilhões por ano. É um dinheiro que os clientes podem usar para comprar mais dispositivos móveis, afirmam as operadoras.
"Nós queremos que as pessoas usem sua carteira [móvel] para fazer todas as transações, inclusive transferências internacionais de dinheiro", diz Dioum. Em 2014, os ugandenses transferiram US$ 72 milhões por meio de remessas de dinheiro para o Quênia, pelos dados do Banco Mundial. Os quenianos enviaram US$ 51 milhões para Uganda.
A Vodafone informou que já tem visto os benefícios da parceria entre as operadoras depois que um acordo em fevereiro permitiu que seus 7 milhões de clientes do M-Pesa na Tanzânia fizessem transações com os 4 milhões de clientes de sua rival Tigo, uma subsidiária da Millicom International Cellular SA.
"Quanto mais pessoas atuando no ecossistema, melhor para todo mundo", diz Greg Reeve, diretor de serviços financeiros móveis da Millicom.
Com a assinatura desse acordo, que veio na sequência de um outro acordo entre a Tigo e duas outras operadoras da Tanzânia no ano passado, o país se tornou o mercado com maior interoperabilidade da África.
Mortimer Hope, diretor de espectro e políticas públicas na África para a Associação do Sistema Global para Comunicações Móveis, diz: "Na Tanzânia, o uso de transferências de dinheiro via dispositivos móveis era bom, mas uma vez que passou a existir a interoperabilidade, houve um aumento acentuado no uso."
A associação, que representa os interesses das operadoras de celular ao redor do mundo, afirma que muitos de seus membros mais inovadores estão trabalhando na África e que os métodos de pagamento via celular que eles lançaram podem acabar sendo implantados dos Estados Unidos até o Japão.
As operadoras africanas informam que elas estão apenas começando a utilizar seu potencial doméstico.
"Nós ainda não sabemos realmente o tamanho [desse negócio]", diz Michael Joseph, diretor de operações de pagamento móveis da Vodafone e ex-diretorpresidente da Safaricom. "Isso é o que estamos apenas começando a capturar", acrescenta.