17/10/2014 - Nadador obtém na Justiça direito de usar marca Cielo
VoltarPor Beatriz Olivon | De São Paulo | Valor Econômico
Uma disputa judicial entre o nadador Cesar Cielo e a credenciadora de cartões de crédito e débito Cielo colocou em xeque a possibilidade de a empresa utilizar futuramente a marca. Por meio de sentença, a Justiça Federal fixou o prazo de 180 dias, após o fim do processo, para que isso ocorra, por entender que a companhia se apropriou indevidamente do nome da família do nadador, após celebrar contrato para o uso da imagem do atleta. A Cielo informou que vai recorrer para o Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região.
De acordo com o processo, em novembro de 2009, a Visanet (antigo nome da Cielo) e o nadador celebraram um contrato que previa a licença para uso de sua imagem nas campanhas promocionais da nova empresa, que estava por ser lançada.
Dois meses antes, porém, a companhia depositou pedidos de registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) para as novas marcas "Identa" e "Cielo". Apesar dos registros, a empresa só escolheu definitivamente qual seria sua marca um dia depois de fechar contrato com o nadador.
Em 2012, o atleta e a empresa que o representa, Cielo e Cielo Comércio de Artigos Esportivos, foram ao Judiciário pedir a nulidade dos registros da marca e abstenção de seu uso pela companhia. De acordo com os autores, os registros teriam sido indevidamente concedidos pelo INPI para a empresa.
"Indubitavelmente, ao escolher a nova marca, a empresa ré tinha total conhecimento da notoriedade do nome do autor", afirma a juíza da 13ª Vara Federal do Rio de Janeiro, Márcia Maria Nunes de Barros. Para a magistrada, o fato de o atleta ter conhecimento do uso de marca idêntica ao seu nome ou mesmo ter celebrado contrato de imagem com a empresa, não implica autorização tácita.
De acordo com a magistrada, a empresa agiu com "lamentável desídia", ao não pactuar expressamente com o nadador a cessão do sobrenome para uso como marca.
O principal argumento da empresa no processo é que Cielo é uma palavra dicionarizada nos idiomas espanhol e italiano. A marca teria sido escolhida como estratégia empresarial para o início de uma nova fase nos negócios - e a associação com a ideia de que "o céu é o limite" para a empresa. A contratação do atleta para a propaganda teria ocorrido em razão da coincidência dos nomes, conforme a companhia.
"Se não tivesse atrelado a sua nova marca ao atleta, a empresa ré poderia defender a tese de que escolheu o signo Cielo por causa do significado nos idiomas espanhol e italiano. Mas ela inequivocamente o fez, e deve arcar com os ônus de sua imprudente escolha", afirma a juíza na sentença.
A magistrada determinou a nulidade da marca com base no artigo 124, XV, da Lei de Propriedade Industrial - e ante a ausência de autorização do titular do sobrenome Cielo. Segundo o dispositivo, não são registráveis como marca o nome civil ou sua assinatura, nome de família ou patronímico e imagem de terceiros, salvo com consentimento do titular, herdeiros ou sucessores.
A decisão de primeira instância também impõe a abstenção do uso da marca depois de 180 dias do trânsito em julgado da decisão (quando não cabem mais recursos), sob pena de pagamento de multa diária de R$ 50 mil.
O prazo é questionado pelo advogado do atleta. Adauto Emerenciano, do escritório Icamp Marcas e Patentes, afirma que pretende recorrer contra o prazo concedido à empresa. "Nesse momento, há uso abusivo pela empresa", diz. O advogado Bruno Costa de Paula, que também representa Cesar Cielo, afirmou que durante o processo houve uma tentativa de acordo, que não ocorreu.
O contrato de imagem firmado entre as partes também é objeto de uma ação de nulidade de cláusulas contratuais com pedido de indenização. De acordo com Costa de Paula, o processo foi suspenso para aguardar a decisão da Justiça Federal do Rio sobre a nulidade das marcas. Com a decisão, o curso deve ser restabelecido.
Para a especialista em propriedade intelectual Simone Lahorgue Nunes, sócia do Levy & Salomão Advogados, a questão do processo foge um pouco da seara da propriedade industrial e entra no direito civil. "A grande discussão se dá nos princípios gerais do direito e não da marca em si", diz.
Segundo a advogada, cabe ao juiz analisar se houve má-fé da empresa para se aproveitar do prestígio pessoal do sobrenome do nadador e passar a usá-lo além do que lhe foi permitido no contrato.
A Advocacia-Geral da União (AGU), que representa o INPI na Justiça, informou que não foi intimada da decisão. Por não conhecer os termos da sentença, afirmou que não há como se pronunciar sobre eventual recurso.
A Cielo informou que se trata de uma decisão de primeira instância e que vai recorrer.