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17/11/2020 - BC eleva exigências para fintechs que oferecem conta de pagamento

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Por Valor Econômico | Talita Moreira
 
 
O Banco Central (BC) começa a endurecer as exigências regulatórias e de capital das grandes fintechs num momento em que algumas delas se tornam mais sofisticadas e ganham relevância no mercado brasileiro.
 
Uma resolução aprovada em outubro e outra minuta colocada em consulta pública na semana passada elevam a barra para instituições de pagamentos (IPs) e emissores de moeda eletrônica, classificações em que se enquadram alguns dos maiores prestadores de serviços de conta digital.
 
As mudanças devem contribuir para mitigar riscos sistêmicos, dado que as fintechs já alcançam dezenas de milhões de clientes no país. Ao mesmo tempo, diminuem o degrau regulatório que se formou (propositalmente, para estimular a concorrência) entre novos competidores e bancos tradicionais. A dúvida no mercado é se o novo desenho não poderá inibir a competição.
 
“O Banco Central está pouco a pouco aumentando o espectro de supervisão sobre as instituições de pagamentos”, afirma o advogado Fabio Braga, sócio da área de direito bancário e financeiro do Demarest. “[As novas regras] começam a pesar, vão ter que montar uma estrutura maior.”
 
A partir do próximo ano, num processo gradual, as IPs terão de pedir autorização do regulador para prestar serviços de emissor de moeda eletrônica, ou seja, para oferecer uma conta digital sem ser um banco. A exigência começa em março de 2021 para instituições com pelo menos R$ 500 milhões em transações de pagamento e abrange empresas de todos os portes de 2023 em diante.
 
Também passará a ser exigido das instituições de pagamento um mínimo de R$ 2 milhões de capital. No caso do iniciador de serviços de pagamento (agente que recebe o comando do cliente, mas mão executa uma transação), o mínimo é de R$ 1 milhão.
 
A resolução é, de forma geral, positiva para tornar o mercado mais seguro, mas os requerimentos de capital são altos demais para novos participantes do mercado, segundo Marcelo Martins, lider da área de meios de pagamento da ABFintechs. “Esse é um grande problema”, diz. “Deveria ter regras mais brandas para quem está começando.”
 
A aposta do BC é que novas fintechs surjam por meio do chamado “sandbox” regulatório, ambiente criado para testar inovações. O problema, segundo Martins, é que uma fintech que não apresentar uma inovação em relação ao que já existe hoje não se encaixaria, em tese, nessa categoria.
 
As principais fintechs do país surgiram e cresceram oferecendo serviços de pagamentos, geralmente num combo conta digital e cartão de crédito. O caso mais notório é o do Nubank, que tem mais de 30 milhões de clientes. A companhia foi fundada em 2013 e só cinco anos mais tarde se tornou também uma instituição financeira, o que lhe dá mais flexibilidade para oferecer produtos de crédito e para captar recursos.
 
Por outro lado, os bancos tradicionais têm se queixado da existência de uma “assimetria regulatória”, situação que permitiria às fintechs competir sem ter de cumprir as mesmas normas que eles.
 
“O BC deixou todo mundo entrar e o mercado crescer, mas o ônus regulatório dele aumentou muito. Hoje, tem modelos diferentes batendo na porta do regulador todos os dias”, afirma Vicente Piccoli Medeiros, advogado do escritório Machado Meyer.
 
Outro movimento da autoridade monetária vai no sentido de equalizar o tratamento dos serviços de pagamentos, sejam eles oferecidos por instituições de pagamentos ou por instituições financeiras (os bancos tradicionais). Uma proposta de resolução colocada em consulta pública no site do BC prevê a criação de uma classificação para essas companhias, levando em conta se elas fazem parte de grupos controlados por bancos, se são instituições de pagamentos “puras” ou conglomerados liderados por IPs e integrados por instituições financeiras.
 
A ideia do BC é que as demandas regulatórias sejam definidas proporcionalmente conforme o tipo de instituição que prestar o serviço. O texto também estabelece um novo cálculo para o patrimônio de referência de quem oferecer serviços de pagamentos. As maiores mudanças virão para os conglomerados que surgiram a partir de IPs, diz Braga, do Demarest, e darão ao regulador uma “leitura mais objetiva” dos riscos que cada grupo cria para o sistema.
 
“Com isso, fica claro o reconhecimento, por parte da autoridade, de alterações substanciais na composição do sistema financeiro nacional, dentre as quais podemos destacar o surgimento de players relevantes, cujo negócio central está ligado ao setor de pagamentos, bem como a maior atenção conferida a esse setor por instituições financeiras tradicionais”, afirma Medeiros, do Machado Meyer.
 
Procurada pelo Valor, a Febraban afirmou que ainda não concluiu a análise do texto colocado em consulta pública, mas disse defender a agenda de competição do BC e ser “favorável à entrada de novos players com submissão de todos a exigências regulatórias simétricas”. A Associação Brasileira de Bancos (ABBC), que reúne bancos pequenos e médios e fintechs, terá uma reunião nesta semana para discutir o texto, segundo o diretor-executivo da entidade, Cláudio Guimarães.
 
Além desses aspectos, o crescimento das fintechs de pagamentos, que lidam com dados sigilosos e, na prática, oferecem para o cliente final um serviço parecido com os dos bancos, exigirá que o BC em algum momento revisite também as normas de compliance, afirma André Martinez, coautor do livro “Compliance bancário: um manual descomplicado”. “O regulador vai ter que equiparar ou dizer que as normas se aplicam também a instituições não financeiras”, diz.
 

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