11/08/2020 - BB levanta discussão sobre ativos de cartões
VoltarPor Valor Econômico | Talita Moreira e Flávia Furlan
O Banco do Brasil (BB) precipitou, com declarações em público, uma discussão sobre a parceria de longa data que mantém com o Bradesco na área de cartões. Existem conversas nos bastidores há meses, conforme noticiou o Valor em fevereiro. No entanto, ao trazê-las para os holofotes, a instituição deu à questão uma urgência que o sócio privado não tem.
Há duas operações principais. Uma delas, mais simples e em fase mais avançada, é o IPO ou venda da bandeira de cartões Elo. A outra, bem mais delicada, diz respeito ao futuro da Cielo — a venda da fatia do BB para o Bradesco é uma das possibilidades, mas a transação é altamente complexa.
O assunto voltou ao radar ontem, quando o presidente do BB, Rubem Novaes, disse que a instituição está examinando os “melhores caminhos” para as parcerias que tem com o Bradesco na área de cartões.
De saída do cargo, Novaes citou a possibilidade de “separar alguns negócios” nesse setor, ao ser questionado sobre o assunto por jornalistas. O executivo disse que uma consultoria foi contratada para “destrinchar” as operações de cartões. A afirmação teve efeito instantâneo nas ações da Cielo, que dispararam na B3, fechando o dia com alta de 10,67%, a R$ 5,60.
Como a credenciadora perdeu participação de mercado e vem há tempos tentando recuperar sua força, notícias sobre a movimentação dos sócios têm gerado grande expectativa entre investidores.
O Valor revelou em fevereiro que o BB havia colocado sob revisão toda a área de cartões, o que poderá resultar na venda de ativos. Na ocasião, Novaes negou ter planos de se desfazer das operações, mas reconheceu que contratou uma assessoria externa para revisar os negócios de cartões como forma de “destravar valor” das operações. Hélio Magalhães, presidente do conselho de administração, conduz as análises do tema.
“Não vou poder adiantar detalhes. No mundo Elopar e Cielo existe muita coisa, muitos negócios. Em alguns, o Bradesco tem mais interesse que nós. Em outros, nós temos mais interesse que o Bradesco. Mas há uma conversa com ajuda de assessoria externa para a gente encontrar os melhores caminhos”, afirmou Novaes na entrevista de ontem.
De acordo com o executivo, nada será decidido sem “o interesse de ambas as partes”. Procurado, o Bradesco informou que não comentaria o assunto.
Alinhar os interesses dos sócios, no caso da Cielo, não é nada simples. A credenciadora vem sendo penalizada devido ao acirramento da competição em seu mercado. Por isso, alguns interlocutores apontam o fechamento de capital como saída para a empresa. Outra possibilidade seria o banco privado adquirir a fatia do BB na credenciadora, aproveitando o preço baixo do ativo.
Porém, o Bradesco não tem intenção de fazer uma oferta para fechar o capital da Cielo e não recebeu ainda nenhuma manifestação formal do BB sobre a suposta intenção de sair da empresa, dizem fontes próximas aos acionistas.
Trazer um novo sócio para a companhia também seria difícil e, hoje, a solução menos provável. Parte do valor da Cielo reside no acesso que ela tem ao balcão do BB e do Bradesco para a venda de seus produtos. Com a saída de um desses bancos, metade desse canal deixa de existir, o que reduz a atratividade do negócio. Ao mesmo tempo, o acordo de acionistas da credenciadora tem cláusulas que inibem as possibilidades de venda da empresa para outras empresas do setor.
Por isso, o candidato ideal numa eventual venda da fatia do BB continua sendo o Bradesco. No entanto, assumir a participação do sócio não é simples. Outro ponto sensível é a participação da Cielo na Cateno, joint venture firmada com o BB cuja principal atividade ainda é processar transações com cartões de débito do banco público.
“A situação da Cielo já está sendo conversada há mais tempo, mas a solução ainda precisa ser desenhada porque é muito complexa”, diz uma das fontes. “Passa pela situação dos acionistas minoritários, pela Cateno e pelo fato de o BB ainda analisar se abre mão de ter uma credenciadora.”
As negociações sobre o destino dos negócios de cartões podem tomar um ritmo mais lento porque o Bradesco vem se sentindo desconfortável com as declarações públicas dos bancos estatais e, diferentemente deles, não tem pressa em resolver o assunto.
Além das declarações de Novaes, já causaram incômodo comentários do presidente da Caixa, Pedro Guimarães, sobre a intenção de fazer o IPO da bandeira de cartões Elo. Bradesco e BB controlam a empresa e a Caixa é minoritária — e, no entanto, foi ela quem levantou a questão em público no início deste ano. Naquele momento, os acionistas majoritários achavam que era cedo para dar esse passo.
Agora, a percepção mudou e o entendimento é o de que a Elo está madura. Nesta semana, o Valor noticiou que há discussões entre BB, Bradesco e Caixa para um IPO da bandeira. Os estudos estão em fase preliminar e a operação deve levar meses para chegar à bolsa. Corre por fora a venda para um concorrente. O BB não vê esse negócio como “core business”. (Colaborou Álvaro Campos)